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Sunday, March 29, 2020

'Cores de Água' que Imprimem Causas 4/20

Já vou na quarta publicação sobre as ditas 'cores de água' que Shakespeare disse que 'imprimem causas'? Por esta altura já devia saber pintar, não? Não! Muito longe ainda de dominar água, quantidades de pigmento, variações de cor... A única coisa que parece que estou a dominar é o pincel. Pelo menos é a ideia que dá a partir da minha última tentativa! 
O que foi que eu fiz desta vez? (Para além de ter aprendido a por musiquinhas nos vídeos?) Ainda a matutar na variação de cores da Mika e na tentativa falhada que partilhei na publicação anterior (3/20), peguei numa nova folha - já só tenho 48! - risquei uma série de retângulos e lá comecei, como na 'causa' anterior, a pintar do mais claro para o mais escuro:

  • (1) variação do rosa - falhada! 
  • (2) variação do azul - sem comentários... 
  • (3) variação de roxo feito por mim mesma - como sobrou muita tinta do (1) e (2), resolvi aproveitar e misturar as duas, acrescentando um pouco de pigmento de cada um, de cada vez que avançava nos retângulos, mas falhou por completo! 
  • (4) variação do amarelo - VITÓRIA! Finalmente consegui! Mereço champagne! Vou dar uma festa com fogo de artifício como a do Gatsby-versão-DiCaprio!
  • (5) variação de verde estranho feito por mim mesma - mais uma vez, sobrou tinta da (3), que já era mistura da (1) e (2), e resolvi misturar com o que sobrou do amarelo da (4), conseguindo um 'verde estranho'. Aqui foi fácil conseguir a variação: bastava ir acrescentando um pouco da mistura do (3) de cada vez que avançava para um novo retângulo. Fácil! (Disse ela, como se percebesse muito disto!)
Enquanto secava e eu apreciava o trabalho hercúleo... O quê? Menos? Menos?!?! Vocês sabem lá o que isto custa! Sim, trabalho hercúleo! Isto é mais difícil do que matar o Leão de Nemeia ou apanhar todas as aves birrentas do Lago Estinfálio! Vocês sabem lá! Quê? Onde é que fica o lago?...

Estava eu a dizer, enquanto eu apreciava o trabalho hercúleo da variação de cores, dei por mim a concluir que era mais fácil se fizesse ao contrário! Se começar por um tom mais escuro e se for acrescentando água, consigo um tom mais claro com mais facilidade? E se usar aguarela em bisnaga, será que desperdiço mais ou será que controlo melhor a variação de cor? Pelo menos controlo melhor a quantidade de tinta... E se usar um conta-gotas? Controlo melhor a variação de cor ou estou apenas a desenvolver um transtorno obsessivo compulsivo?  

Sunday, March 22, 2020

'Cores de Água' que Imprimem Causas 3/20

Depois do resultado desastroso da semana passada... resolvi continuar! Como dizem que disse Winston Churchill, o sucesso é ir de fracasso em fracasso sem perder o entusiasmo!

Estive a ver dois vídeos no Magia da Cor (este, sobre materiais e este, sobre inspiração) e registei  algumas notas como se fosse o 'detective sergeant' do 'detective chief inspector' da série britânica policial Midsommer Murders que ando a ver! Informações a acrescentar neste momento:
  • os pincéis naturais são melhores e mais duráveis do que os sintéticos - mas eu adoro o meu sintético! Os tais que me custaram apenas €1 são de pêlo de pónei e confesso que me faz um pouco de confusão saber que pode andar por aí algum pónei com falha de pêlo;
  • guardar a tinta que sobra no godé - eu deitava fora, sendo portanto útil um godé com tampa;
  • borracha pão (pt) ou borracha limpa-tipo (br) - já me tinha interrogado como é que eu ia apagar as linhas a lápis sem estragar a pintura;
  • pedir autorização para copiar trabalhos - faço sempre, até porque gosto de avisar os verdadeiros artistas que estou prestes a assassinar as suas belas obras de arte!  
Enchi os pulmões de coragem e lembrei-me da variação de cores que a Mika mostrou naquela linda pintura, feita com apenas duas cores, no vídeo que partilhei na publicação anterior (2/20). No verso da folha usada na semana passada - eu disse que estas 50 folhas iam ser muito poupadinhas! - marquei doze pequenos círculos em grupos de três e o objetivo era usar os dois verdes, o laranja e o vermelho do meu estojo de aguarelas da Giotto em três tons diferentes, do mais claro para o mais escuro.    
Nossa, de quem é esta mão linda e elegantérrima? Ah, é minha! Bom, então o que é que eu resolvi fazer na primeira fila (1)? Comecei pela técnica aguada, depois usei o verde bastante diluído - olhem esse jeitinho para sugar o excesso de água com o lenço, ignorando a toalha ali ao lado, que profissionalismo! - e ficou um tom bem claro. Objetivo cumprido! Passei para o segundo círculo, teria de ser um tom mais forte que o anterior, mas não muito, porque tinha ainda um terceiro para um tom mais escuro. Usei o pincel com alguma cor, ia usar a técnica média (se não existe, passa a existir!) e por isso fiz o mesmo no terceiro círculo. A lógica era ter os círculos iguais e acentuar a cor no segundo e no terceiro... Será que resultou? Nãooo! Óbvio que não! O segundo círculo ficou muito mais escuro que o terceiro. Grrr!

Segunda tentativa: mesmo método! Comecei a suspeitar que podia ser a encarnação do Churchill, pois estava a ir de fracasso em fracasso e não perdia o entusiasmo! Sucesso é que nem vê-lo! Talvez fosse um pouco cedo... Resultado: só na (2) e na (4) consegui o efeito que pretendia, embora não faça ideia como! No terceiro círculo da (3) exagerei nas vezes que passei tinta e o papel começou a desfazer-se um pouco. Também preciso aprender a controlar a quantidade de água com tinta puxada no pincel, pois espalha com facilidade para fora dos limites pretendidos.


Enquanto datava e assinava, lembrei-me dos versos finais do poema de Robert Frost: ainda tenho muitas milhas pela frente! Muitas mesmo... 

Sunday, March 15, 2020

'Cores de Água' que Imprimem Causas 2/20

Antes de começar, convém referir que, sem contar com o uso de guaches na escola, eu nunca me aventurei na pintura. A não ser a da cerca de madeira que vedava o acesso do meu cão - um caniche preto de porte médio que mais parecia um tiranossauro fofinho - ao jardim, evitando que ele trucidasse tudo o que fosse planta.

Entretanto, das minhas passeatas pelo YouTube à procura de 'aguarelamentos', surgiu nas recomendações este vídeo da Mika Serur (ver canal na lista dos links). A imagem de fundo tem aguarelas tão lindas que decidi ver antes de começar. Claro que não devia ter visto - fiquei com receio de não conseguir pintar nada decente - mas as dicas são muito úteis e o vídeo atira a inspiração lá para o 'espaço espacial', bem alto... até quase atinge um buraco negro!   



Dicas mais importantes:
  • precisamos experimentar, fazer, fazer, fazer, praticar, praticar, praticar;
  • materiais: pincéis redondos; papel 300g ou, para começar, 200g (usar o lado com textura); aguarela em pastilha dura mais, porque se desperdiça menos do que em bisnaga; passar a fita de pintura numa superfície para retirar um pouco da cola antes de usar; 
  • água: usar com fartura - toda a do oceano, Mika? - pois a água é o que dá o tom claro à cor e serve também para corrigir erros (anotado!);
  • precisamos de paciência: tem de secar cada camada antes de pintar novamente;
  • não há manual de técnicas: resta experimentar e depois registar como se fez;
  • aguarela tem vida própria: nada fica igual; usar folha de teste e terminar sempre o trabalho!   
Nota: Adorei o estado da toalha da Mika. A minha tem de ficar igualzinha!
Nota dramática: Aos 6'25'' a Mika dá exemplos e eu morri de inveja: vou ter de conseguir fazer aqueles triângulos também! E aquele dos níveis de diluição da cor? Como é que eu faço aquilo? (Foi nesta parte do vídeo em que a minha inspiração começou a entrar no tal buraco negro!)

Arranquei a primeira folha ao bloco Canson Imagine 200g A5 - as superfícies frente e verso são idênticas - e marquei seis círculos bem grandes para a minha primeira experiência. Pincel na água transferida para o godé... Calma, não devia ter sido pincel na água e puxar tinta da pastilha? Bom, pincel na pastilha rosa e lá fui eu, testando, tentando perceber a quantidade de tinta e de água necessárias para preencher o círculo, usando a técnica seca (1):  
Ficou... horrível. Avancei então para o segundo círculo, mas passei primeiro uma camada de água e só depois a tinta, técnica aguada, e ficou melhor (2). Mais entusiasmada com o resultado, avancei para a segunda linha de círculos, usando a pastilha azul (3). Só tenho pena de não ter apagado dados no telemóvel para ter mais tempo de gravação e registar os meus primeiros passos na aguarela, se bem que eu não estou a dar passos, estou a gatinhar... 
Continuei! Lá fui: no seguinte (4) pintei muito aguado (não sei se existe, mas já que não há manual, eu acabo de nomear a técnica 'muito aguado'!), deixei secar um pouco, pintei metade com mais tinta e menos água, deixei secar novamente e depois perdi a cabeça e usei o azul escuro por cima. Conclusão: as cores escuras parecem ser mais fáceis de dominar. Já que tinha inaugurado a técnica muito aguado, voltei ao rosa (5), muito diluído e depois voltei ao aguado com o roxo (6).

Ainda não satisfeita com a trapalhada, voltei ao primeiro círculo agora bem seco e resolvi experimentar um tema floral (ou melhor, tentei pintar umas folhas, mas eu não sei pintar folhas!) em branco, por cima, para ver no que dava (7). Deu asneira!


Assinei, pus data da desgraça, fiz as minhas anotações e acrescentei ainda uma frase de um amigo meu que tem de lidar com a minha obsessão pela perfeição e me diz muitas vezes: aprender por passos imperfeitos. E aguarelas é isto: aprender por passos imperfeitos! 

Sunday, March 08, 2020

'Cores de Água' que Imprimem Causas 1/20

Resolvi 'aguarelar'. Podia treinar para a maratona, por exemplo, mas está a chover. Podia usar um daqueles livros de colorir com a desculpa de ser arteterapia, mas não sei onde está o meu. (Entretanto encontrei: ver aqui.) Está na hora de deixar a arte e passar a fazer arte. Ou borradas. O tempo dirá.

Vi um curso numa academia de artes plásticas no Porto que custava tanto quanto um candeeiro em latão que ficava mesmo bem, mas mesmo muito bem, na minha mesa. Entre 6 aulas de 2 horas aos sábados de manhã e um candeeiro vintage, resolvi ir ao YouTube. 

Um dos primeiros vídeos que vi foi este, do canal Magia da Cor (ver lista dos links):     


Conclusões a que cheguei: 
  • o desenho é preso à superfície com fita de pintura (pt) ou fita crepe (br), servindo de margem - será que também pode ser usada para cobrir as áreas que não serão pintadas, ou haverá algo mais prático do que contornar com o pincel? [resposta aqui]
  • a superfície do céu é primeiro molhada com água - vim a descobrir que é a técnica aguada, para ajudar a diluir e clarear a cor, que posteriormente é acentuada por camadas; 
  • as aguarelas usadas são em bisnaga e não pastilha - presumo que sejam mais práticas para controlar o tom da cor; 
  • o pincel usado é o de água, que eu julgava serem apenas usados para as pinturas com lápis de cor de aguarela - sim, esta coisa existe e está na minha lista de experiências;
  • o godé (pt) ou godê (br) é ótimo e a esponjinha para sugar o excesso da água também - o meu godé é patético e uso lenços de papel, papel absorvente, toalha, enfim... 
Material de iniciante com falta de jeito que já reuni: 
  • bloco o desenho Canson XL Aquarelle 300g A4 que comprei, à gulosa, na FNAC por €8.09 e que resolvi guardar para quando souber pintar algo decente - é um desperdício gastar papel de qualidade tão boa nas experiências e se estão a perguntar-se porque é que eu estou a poupar... é que o raio do bloco só traz 30 míseras folhas! 30!  
  • resolvi então ser mais modesta e comprei um bloco de desenho Canson Imagine 200g A5, na FNAC (não recebo nada pela publicidade, mas se a FNAC me estiver a ouvir, ou a ler...) por €4.49 - 50 folhas que vão ser muito poupadinhas!
  • estojo caixa de 12 aguarelas Giotto com pincel, na FNAC por €2.96 - eu toda feliz da vida, a pensar que era italiana, uma vez que todo o meu material da pintura da Giotto é maravilhoso e é feito em Itália, achei que o preço era de promoção, vou a ver e... não, não é feito na China, é na Índia! 
  • ainda na onda de achar que era em promoção de fim de stock, comprei também um conjunto de 3 Pincéis escolares Giotto por, pasmem-se, €1! - sim, feito na China! Entretanto vim a descobrir que não faltam pincéis nº 5 nesta casa... enfim!
Guardei o bloco das míseras 30 folhas e os pincéis extra, já que vou usar o que vem no estojo da Giotto, um pincel de pêlo sintético sem número, mas eu penso que é nº 5; separei uma pequena toalha branca para a ir vendo a manchar-se de tinta e me dar aquele ar de pintora profissional; um copo, ou melhor, um frasco grande que era de compota, uma vez que o vidro é pesado e assim não corro o risco de o entornar e dá para bastante água; e uma vez que a origem do material me estava a sair furada, hoje fui a uma enorme loja dos chineses (tão grande que me perdi lá dento, juro!) e comprei um godé de 4 espaços da Artix Paints 9x9 cm por €0.95. [atualização da lista de material aqui]

Estou pronta para começar! Começar por onde? Vou fazer uns círculos e experimentar a tal técnica aguada, a técnica seca e sobrepor cores... Vou descobrir, ora!

Sunday, March 01, 2020

'Cores de Água' que Imprimem Causas

Shakespeare, Henry IV, Parte I (1596), acto 5, cena 1, linha 80

Aguarela ou cores de água, water-colours, é uma técnica de pintura antiga que faz parte de muitas culturas. No Ocidente, começou por ser usada na Idade Média, para colorir os mapas e as iluminuras nos manuscritos. Entre os séculos XVIII e XIX, alguns artistas começaram a colorir os desenhos monocromáticos (gravuras) muito comuns na época.

No início, os pigmentos eram naturais; as pastilhas - pequenos blocos de pigmentos duros - como hoje as conhecemos, foram inventadas em 1780, sendo diluídas em água. A cor obtida era aplicada com um pincel num papel desenvolvido na mesma década, resistente o suficiente para suportar a água. Os primeiros estojos de pintura eram feitos pelos próprios artistas, seguindo uma publicação de 1731 que fornecia instruções sobre como os fazer; em 1830 começaram a ser comercializados os primeiros estojos, tendo sido vendidos cerca de 11 milhões, entre 1853 e 1870. 

No século XVIII tornou-se moda as viagens pela Europa - Paris, Veneza, Roma... Viajavam apenas aqueles de classe privilegiada, na sua grande maioria ingleses - basta ver os retratos de Batoni - e alemães, como Goethe. Uma das formas de registar o que viam era desenhar, eles mesmos, e colorir, de forma rápida, as paisagens, tornando-as o mais realistas possíveis. 

'View of the Villa Lante on the Janiculum in Rome' (1782)
John Cozens (1752-1797)
Desenho em aguarela com traços de grafite, 25x36 cm
Museu Metropolitano de Nova Iorque, Rogers Fund, 1967

Os pintores de aguarelas participaram nas exposições públicas anuais, mas as condições eram inferiores ao que pretendiam: as suas obras, relegadas para segundo plano em salas pouco iluminadas, pareciam não poder competir com as pinturas a óleo. 

Para saber mais:
Barker, E. (2004), 'Watercolor Painting in Britain, 1750-1850'. In Heilbrunn Timeline of Art History. New York: The Metropolitan Museum of Art.